terça-feira, 9 de outubro de 2012

Elvis in Concert - show em São Paulo

Elvis In Concert: você jura que ele está ali, com o resto da banda
Após meses de espera, finalmente chegou o dia do primeiro show de Elvis e sua banda em São Paulo. Meses? Décadas, na verdade. Afinal de contas, Elvis nunca chegou nem perto de tocar no Brasil. Na verdade, nunca saiu dos Estados Unidos com sua banda.

Você pode ter reparado que o parágrafo acima inteiro dá a impressão que Presley está realmente entre o mundo dos vivos - mas é quase isso. O show Elvis Presley In Concert, que chegou ao Brasil com passagens por São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, é único, indescritível, uma viagem no tempo muito bem projetada, executada e absolutamente surreal. Mas, acima de tudo, é uma maravilha para quem gosta de música.

Lembro-me de ver uma declaração do baterista de Elvis, Ronnie Tut, já no alto de seus 73 anos, quando o show foi promovido, no começo deste ano: "É diferente de tocar ao vivo. Você sabe que, se errar, o Elvis não irá parar por você". Exatamente. Por isso, um show tão singular, em que o ensaio ganha proporções imensas e fundamentais para que tudo corra bem. E corre. Ao longo do show inteiro, apenas em duas músicas foi possível notar um pequeno, minúsculo delay entre Elvis e banda. Nada que comprometesse a qualidade - provavelmente, a maioria do público sequer notou.

Elvis In Concert, para quem chegou a esse post do nada, é o nome da turnê que reúne parte da banda original de Presley durante a década de 1970. Como funciona? Apresentações em vídeo de Elvis foram remasterizadas. Todo o áudio externo delas foi isolado, deixando apenas a voz do artista presente. Essa voz, em vídeo, é acompanhada ao vivo por banda e orquestra formada por alguns membros TCB Band, como era chamado o grupo que acompanhava Elvis entre 1969 e julho de 1977.

O show foi no ginásio do Ibirapuera. Não é a melhor casa de shows do Brasil, mas foi bem melhor do que eu esperava. Há uma demora considerável para o início do concerto. Marcado para 21h, a plateia ainda tem de ouvir um apresentador mambembe falando sobre patrocinadores como se fosse a coisa mais natural do mundo. Mas, após uma certa espera, há o início: um vídeo no melhor estilo Google Maps mostra a Terra, enquanto a câmera vai se aproximando de São Paulo, até chegar ao Ginásio do Ibirapuera. Então, uma enorme assinatura de Elvis domina a tela. Ao fundo, começa a tocar duas músicas de entrada: inicialmente, uma versão genérica de Also Spracht Zarathustra, que foi usada no filme Elvis On Tour. Imagens do Rei no camarim, se dirigindo ao palco, levam à plateia ao delírio. Eu fiquei emocionado. É difícil não achar que o cantor está, realmente, logo ali, pronto para entrar em cena. No meio do universo elvístico, você de repente acha que, ou voltou no tempo, ou todos nós envelhecemos, menos Elvis.

Abertura do show

Então, a versão correta do tema de 2001: Uma Odisséia no Espaço começa, dando mais nervosismo a todos. O show está começando! Terminada a introdução, a clássica virada de bateria de Ronnie Tut, claro, um pouco mais cansada que as feitas em 1972, mas ainda vibrantes. A cortina ainda está fechada, enquanto você vê a silhueta de Elvis, em tamanho real, andando por trás dela, de um lado para o outro do palco, agradecendo aos presentes. Incrível. Mágico. Quase assustador de tão belo. Lágrimas de novo.

A cortina, então, cai, e subitamente você lembra que não, o Elvis não está ali. Mas não há tempo para decepções. Elvis está em um imenso telão central, acompanhado por mais duas telas menores que focam sempre na banda. See See Rider, na versão do show de 1973 no Havaí, é a escolhida para a abertura. E a banda está mandando muito bem. Não só ela, mas uma orquestra inteira, coordenada pelo maestro Joe Guercio (também da formação de Elvis nos anos 1970), dá o peso suficiente para que você curta cada segundo. Vem o primeiro solo do guitarrista James Burton e você começa a pensar que essa será uma noite incrível. É curioso ver o mesmo James Burton, jovem e ágil ao lado de Elvis no telão central, se misturando com o Burton atual, ainda arrepiando na guitarra, mas já com os sinais da idade. O tempo é uma coisa doida.

Ao meu lado, pessoas de todas as idades. Ginásio lotado, o Ibirapuera parecia com os estádios e ginásios em que Elvis costumava tocar no meio dos anos 1970. Na minha frente, uma garota nascida em 1990 acompanhada da avó gritava como nunca. Veio de vestido longo, penteado feito e uma corrente com o logo TCB ("Taking Care of Business", o mote de Elvis) no pescoço. "Minha avó trouxe de Memphis para mim", diz, orgulhosa. Atrás de mim, outra fã não conseguia se controlar. "Gostoso! Elvis I love you! Tesão!", gritava. Fãs com topetes, pessoas bem arrumadas em vestidos longos, pessoas de todos os cantos do Brasil e países vizinhos: Elvis tocava para a América Latina.

As primeiras músicas do show foram essencialmente baseadas no  Aloha From Hawaii, apresentação que Presley fez via satélite em 1973. Depois de See See Rider, uma versão estupenda de Burning Love incendiou a plateia, que cantava, gritava incansavelmente e aplaudia efusivamente ao fim de cada faixa. Welcome To My World e Steamroller Blues vieram em seguida.

Primeiras músicas foram retiradas do "Aloha From Hawaii"
Ao longo de todo o show, impressionou a perfeita sincronia entre Elvis e banda - tão perfeita como na época em que tocavam juntos. O estilo do Rei do Rock sempre foi muito visual. Praticante de karatê, ao fim de cada música ele performava gestos e golpes no ar para encerrar a música junto com o último rufar da bateria. E assim foi ao longo de toda a noite. Da banda original de Elvis, não estavam todos ali. Além dos que já faleceram, claro, nem todos os vivos puderam - ou quiseram - vir. James Burton, o guitarrista que me deu uma palheta em 2008, Ronnie Tut, o baterista que inovou ao usar bumbo duplo - o que ainda faz -, Glen Hardin e seu piano sempre essencial, além de membros dos backin vocals Sweet Inspirations e The Imperials. Alguns notadamente velhinhos - uma das cantoras teve de ficar sentada o show todo - e outros muito bem dispostos. A banda é animada e reage muito bem ao calor do público - que foi à loucura do início ao fim.

Aos poucos, o set list foi deixando o Havaí e parou em Las Vegas. Apresentações filmadas para o That's The Way It Is, de 1970, formaram boa parte do que viria depois. Versões de clássicos dos anos 1950, como Don't Be Cruel, Heartbreak Hotel e Are You Lonesome Tonight? (na famosa versão sentada com guitarra) emocionaram a todos. Love Me Tender, recheada por beijos das mulheres que iam até a boca do palco (e de Elvis), provavelmente deixaram as moças no Ibirapuera com inveja por não estarem na gravação original, mais de 40 anos atrás.

Confesso que tentei anotar ou memorizar todas as músicas do show, mas não deu. Um típico show de Presley naquele período tinha 24 músicas, mas essa teve muito mais. Talvez por isso, houve um intervalo no meio do show - algo inusitado para o formato, mas temos de lembrar que ninguém ali no palco é criança mais. A primeira parte do concerto terminou com If I Can Dream, música que, aliás, nunca foi tocada pela TCB Band originalmente (ela fazia parte do 68 Comeback Special).

Elvis cantando "If I Can Dream"
A segunda parte começou com a intimista versão de Trouble/Guitar Man do especial de 68, mostrando Elvis no auge, em close no telão. O lado gospel então ganhou força - o público geral não sabe, mas os dois prêmio Grammy que Elvis ganhou na carreira foram por interpretações religiosas. Elvis Presley cresceu cantando gospel, e esse foi um lado de sua vida que ele jamais abandonou, inclusive levando aos palcos. Em um dos momentos mais emocionantes da noite, o coral The Imperials foi à frente para cantar Sweet, Sweet Spirit. O mais curioso é que isso aconteceu também em um show - em 1972, no documentário Elvis On Tour, o cantor pede a mesma coisa. Ou seja, enquanto o coral cantava ao vivo, Elvis permanecia em silêncio, no telão, cantando para si mesmo e apreciando a música como todos nós. Mágico.

Se Sweet, Sweet Spirit não arrancou lágrimas de todos, caberia à próxima, How Great Thou Art, fazer isso. Uma versão soberba, de arrepiar, com Elvis, banda e orquestra arrancando o máximo, com um som de preencheu todo o ginásio e certamente impactou muita gente.

Ainda teve espaço para muitos outros sucessos. Polk Salad Annie me lembrou o pedido que fiz a James Burton. You've Lost That Lovin' Feelin' foi cantada em coro por quase todos. Suspicious Minds foi outro clássico que, quando começou, empolgou tanto que fez com que todos se levantassem. My Way e What Now My Love mostraram, mais uma vez, o poderio vocal do cantor - destaque também para os arranjos da orquestra, incrivelmente fieis aos originais.

Polk Salad Annie

An American Trilogy contou com uma participação mais forte do Sweet Inspirations, o que, mais uma vez, fez a plateia delirar de emoção. Can't Help Falling In Love, como deveria ser, encerrou a apresentação, com as letras no telão para todos cantarem juntos. Poucos minutos depois, veio o folclórico anúncio: "Elvis has left the building!". Terminava ali uma experiência musical maravilhosa.

Faltou alguma música? Eu teria incluído Unchained Melody, de 1977. Pra quem não sabe, Elvis fez mais um especial de TV que poderia ser aproveitado no show. Gravado dois meses antes de sua morte, provavelmente a Elvis Presley Enterprise achou por bem não expor Elvis em seu pior momento físico - ainda que com a voz mais poderosa que já teve.

Resumo
É difícil avaliar um show como esse, que eu espero há tantos e tantos anos, e separar o profissional do pessoal. Mas, como este é, justamente, um blog pessoal e não uma reportagem para uma revista, dane-se: o show é espetacular. Qualquer um que goste de rock, blues, gospel e afins deve assistir a um show desses. Sim, o Elvis não está lá, mas o calibre dos músicos somente já é mais que suficiente para uma noite memorável.

Ainda há ingressos disponíveis. Quem quiser, pode ir atrás em www.ingressorapido.com.br ou no site do Via Funchal.

Tentei remontar o set list da noite, mais ou menos na ordem que me lembro. Se alguém tiver o set correto ou lembrar de alguma música faltante, agradeço.

Os vídeos/áudios foram retirados de:

- 68 Comeback Special: especial de TV exibido em dezembro de 1968
- That's The Way It Is: filme-documentário com shows de Elvis em agosto de 1970
- Elvis On Tour: filme-documentário mostrando shows de Elvis no início de 1972)
- Aloha From Hawaii: show transmitido via satélite em 14 de janeiro de 1973)
- Elvis In Concert: especial de TV gravado em junho de 1977


1. Also Spracht Zarathustra (Theme from 2001: Space Oddissey)
2. See See Rider (Aloha)
3. Burning Love (Aloha)
4. Welcome To My World (Aloha)
5. Steamroller Blues (Aloha)
6. You Gave Me A Mountain (Aloha)
7. That's All Right (That's The Way It Is)
8. Don't Cry Daddy (That's The Way It Is)
9. Introductions By Elvis / Johnny B. Goode (Aloha, com improvisações)
10. Heartbreak Hotel (That's The Way It Is)
11. Don't Be Cruel (That's The Way It Is)
12. Blue Suede Shoes (That's The Way It Is)
13. Are You Lonesome Tonight? (That's The Way It Is)
14. Love Me Tender (That's The Way It Is)
15. Hound Dog (That's The Way It Is)
16. If I Can Dream (68 Comeback)


Intermission

17. Trouble / Guitar Man (68 Comeback)
18. Polk Salad Annie (That's The Way It Is, com arranjos pós-74)

19. You've Lost That Lovin' Feelin' (That's The Way It Is)
20. Sweet, Sweet Spirit (The Imperials) (Elvis On Tour)
21. How Great Thou Art (Elvis On Tour, com vocal de Elvis In Concert, 1977)
22. The Wonder Of You (That's The Way It Is)
23. My Way (Aloha)
24. I Got A Woman (That's The Way It Is)
25. What Now My Love (Aloha)
26. I'll Remember You (Aloha)
27. Funny How Time Slips Away (Elvis On Tour, com Elvis pedindo para as luzes se acenderem e a plateia sendo exibida)
28. Big Hunk O' Love (Aloha)
29. An American Trilogy (Aloha)
30. In The Ghetto (That's The Way It Is)
31. Suspicious Minds (That's The Way It Is)
32. Can't Help Falling In Love (Aloha)

Revivendo as músicas que inspiraram uma geração

2 comentários:

Suas lindas disse...

Uma única palavra que reuniria qualquer avaliação sobre o ELVIS IN CONCERT é "emoção".
"Emoção" de ver tantas pessoas que sequer viram Elvis vivo (como eu) reunidas simplesmente para admirar o ídolo;
"Emoção" de ver tantas pessoas trabalhando para que o "sonho" de ver Elvis no palco fosse possível;
"Emoção" de vê-lo e ouvi-lo, além de sentir a presença dele.
"Emoção" de ver pessoas que ver a platéia cantando emocionada, vibrando e admirando o seu ídolo.
Enfim... como diria o outro rei, são tantas emoções... Adorei ter ido nesse show e gostaria fazer isso novamente.

Ah, só mais uma coisa. Falou Always on my Mind. :)

Luís Joly disse...

É verdade! Emoção do começo ao fim! Sobre seu pedido de música, há uma explicação simples: Elvis jamais tocou Always on my Mind nos shows, somente em estúdio. Assim, não teriam de onde tirar o vídeo...:-(